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Um Xuxu na Patagônia
#34
Avisto algumas motos paradas no acostamento do outro lado. Sem pestanejar, reduzo a velocidade e pergunto se são brasileiros. Nem iniciam a conversa me pergunto se eu tenho uma farmácia, pois um deles estava passando muito mal, com diarréia, fruto provavelmente de uma intoxicação alimentar. Só então eu olho em direção a algumas árvores e percebo um motociclista parado, de costas, refazendo-se de seu último “download”. Era um grupo de Santa Catarina e estavam em motocicletas Suzuki Hayabusa 1.300cc, duas Suzuki V-Strom e uma Bandit 1.200cc.

Foto 89: Motociclistas catarinenses na patagônia
[Imagem: PICT1210.jpg]

Após algumas trocas de adesivos e experiências, explico que faltava uns 150 Km para a cidade de Bahia Blanca, onde certamente encontraríam uma farmácia para adquirir umas pílulas de carvão vegetal ativado para minimizar os efeitos devastadores da diarréia.

O motociclista enfermo, sem nenhuma explicação, sobe na moto e sai “enrolando o cabo”, sinônimo de que estava realmente chateado por causar o atraso no grupo. Este é outro bom motivo para não fazer longas viagens em grupo. Comentei que eles poderiam deixar o amigo em um hotel por dois ou três dias e seguir viagem, pois trata-se de um problema de saúde sem maiores consequências, onde o remédio correto e o repouso resolveria o problema.

Rapidamente seus amigos o seguiram.

Da Ruta 3 entra-se num ramal de aproximadamente 5 km para a cidade de Puerto Madryn.

Localizada na Província (o correspondente ao Estado no Brasil) de Chubut, na orla do Golfo Nuevo e conhecida como pólo turístico de observação de animais marinhos, como baleias, leões marinhos e pinguins, Puerto Madryn é uma linda cidade litorânea. Organizada e limpa, chama a atenção a extensa área de lazer arborizada ao longo de toda a orla. Os 50.000 habitantes fixos contam com um ótimo comércio e um número ainda maior de turistas de todo o mundo encontram muitas lojas de souvenires e produtos que lembram o principal motivo da viagem: a vida marinha.

No dia seguinte acordo e saio para procurar uma oficina de moto, pois a XT já apresentava sinais de desgaste na relação de transmissão, conhecida como kit corôa, corrente e pinhão.

Converso com o mecânico que ajusta e lubrifica a corrente e me ensina os nomes espanhóis: corona, cadena e pinhón. Apertar a corrente é “tensar la cadena”. Seria útil caso uma urgência acontecesse no meio da estrada.

Retorno ao hostel e analiso um folheto explicativo sobre a Peninsula Valdes, ponto turístico da região. Já eram duas da tarde e eu não estava a fim de viajar, então porque não fazer este passeio?

Visto a calça jeans e uma camiseta. Fico em dúvida, mas coloco no bauleto da moto um casaco de nylon emprestado por meu amigo em Florianópolis e sigo em direção ao norte, por uma estrada asfaltado paralela a Ruta 3.

Já no início do caminho, 20 km após a cidade, percebo que seria mais que um simples “passeio”. O vento fortíssimo empurrava a XT para os lados. O sol escaldante lembrava-me que eu estava de camiseta. Paro no acostamento para colocar o providencial casaco, que me salvou de queimaduras e do frio. É paradoxal, mas nesta região a natureza mostra toda a sua força e o viajante pode queimar-se e congelar-se de frio ao mesmo tempo.

Desvio à direita, encaminhando-me para a península e mais uns 40 km chega-se a portaria do Parque Nacional da Península Valdes e também um patrimônio da humanidade, por ser local de descando e convívio de grande número de espécies marinhas.

Ao longo do caminho, várias placas alertavam-me sobre o perigo de cruzar o caminho de animais selvagens. Observei muitas ovelhas soltas pelo deserto. Por ser estrangeiro, paguei 40 pesos pela entrada.

Mais uns 15 km e chega-se ao centro de recepção ao turista. Vários grupos falando espanhol ou inglês escutavam as explicações dos guias locais. Me aproximei de um guia falando com um americano, que ao descobrir sobre minha viagem de moto, logo quis conhecê-la e ouvir minhas histórias. Já eram quase 4:00 da tarde e eu sabia que havia muito chão pela frente. Encurtei a conversa e parti para a península. Não sem antes perguntar sobre as distâncias e sobre o abastecimento de gasolina.

Foto 96: Centro de recepção aos turistas da Península Valdes
[Imagem: PICT1221.jpg]

Foto 98: Placa informando sobre os perigos do rípio.
[Imagem: PICT1223.jpg]

O rípio é o que conhecemos no Brasil por estrada de terra, com o diferencial que, no rípio, há muito mais pedras de vários tamanhos. Pilota-se sobre as pedras o tempo todo. A sensação é semelhante a pilotar na areia, pois as rodas sambam no terreno instável e com a diferença que não se pode andar devagar, pois as distâncias são enormes e a noite estava chegando. Como eu nunca havia tido esta experiência antes, diminuí a velocidade e rodei a 30 km/h pelos primeiros quilômetros. Confesso que pensei em desistir por várias vezes. Eu estava num país estranho, num ponto desértico onde raros carros cruzam o seu caminho e mais raros ainda param para te ajudar. Já era tarde avançada e eu ainda tinha 200 km de rípio pela frente.

Sigo por mais 30 km até chagar a Caleta Valdes, ponto de observação de Pinguins. Havia centenas deles, alguns a menos de um metro, que pareciam não se importar com a presença humana, chegando mesmo a fazer pose para as fotos.

Foto 101: Pinguins na Península Valdes
[Imagem: PICT1242.jpg]

Ao passar ao largo da cidade de Trelew, 70 km ao sul de Puerto Madryn, me impressionei com seu tamanho. Apesar de possuir apenas 80.000 habitantes, por vários quilômetros a estrada corta áreas urbanas. De forte influência da cultura inglesa, a cidade conta com o mais importante Museu e Centro de Estudos Paleontológicos da América Latina, pois a região do continente que eu estava penetrando foi o habitat natural de dezenas de espécies de dinossauros e outros animais pré-históricos.

Foto 112: Placa indicativa para meu destino: Esquel.
[Imagem: PICT1258.jpg]

O Rio Chubut, que empresta o nome à Provincia é o grande ator e arquiteto do maravilhoso cenário natural. Nos próximos 200 km, percorre-se um vale enorme onde a calha do rio recorta as areias do deserto, formando depressões entre ambos os lados com larguras de até 1 km.

Foto 114: Calha do rio Chubut, mostrando a erosão das falésias
[Imagem: PICT1272.jpg]

A primeira sensação que tive foi estar no “Parque dos Dinossauros”, pois além de ser uma região inóspita, onde a presença humana ainda não se fez presente, a não ser o próprio asfalto da rodovia, toda esta área era habitada pelos antigos e gigantescos répteis pré-históricos. Com um pouco de criatividade, pode-se imaginar um grupo de Tiranossauros Rex bebendo nas águas do rio Chubut. Tudo aqui permanece com a aparência de milhões de anos atrás. Um verdadeiro paraíso dos paleontólogos.

O sol batia forte na cabeça. Eu já estava cansado dos quase 700 km daquele trecho. E, suando dentro da jaqueta, empurrei a moto para a lateral da rua, pedi licença para o funcionário de uma loja de informática e descarreguei os alforges e o galão. Enquanto descansava, o dono da loja chegou e me ofereceu ajuda. Era o Federico, um piloto de “carreras”ou seja, trilheiro. Foi o primeiro argentino que me ajudou de maneira fantástica.

Foto 121: A XT na oficina
[Imagem: PICT1277.jpg]

Acordo por volta das 7:00 e sigo para Bariloche. Sigo lentamente para curtir a natureza e também para testar o desempenho da nova relação da moto. Alguns jovens mochileiros já pediam carona na saída da cidade. O agradável cenário de montanhas continuou. 10 km após a cidade coloco a mão na cintura e me assusto com a falta da pochete. Olho para baixo e confirmo: esqueci no hostel. Todos os meus documentos e dinheiro estavam nela!!!

A famosa Ruta 40 começa a subir as montanhas, serpenteando pelos vales e florestas de pinheiros. Esta rodovia é conhecida por cruzar a argentina de norte a sul, tal qual a Ruta 3, porém pelo lado oriental, próximo a Cordilheira dos Andes. Seu único trecho asfaltado era aquele pelo qual eu estava passando. Todo o resto, quase 2.000 km até a cidade chilena de Punta Arenas, próximo ao Ushuaia, é de rípio. Um verdadeiro e maior desafio para os viajantes que se aventuram por esta região.

Chego próximo a cidade de Bariloche e percebo que se localiza em um vale, cercada por dois lados de montanhas e no outro por um lago de águas cristalinas, azul-celeste e lindíssimo. Na verdade, toda a região compreendida pelos andes centrais argentinos e chilenos é cercada de centenas de lagos formados pelas águas descongeladas das montanhas. Uma imensidão de água perfeita para o turismo e para a prática de esportes náuticos. Existem muitas marinas e lanchas sendo rebocadas por todos os lados.

Foto 122: Bariloche, com seu grande lago a frente
[Imagem: PICT1280.jpg]

Contornado o Lago Moreno, sigo por um desvio de rípio em direção ao Cerro (morro) Catedral. Já no asfalto, sigo por 10 km e chego a sua base, que conta com uma grande área plana ocupada por um moderno complexo de recepção aos turistas, que invadem-na durante a alta temporada do inverno para a prática de esqui. Existem cinco linhas de teleféricos e bondinhos para a subida da montanha de 2.000 m de altura.

Foto 130: Bariloche vista do Cerro Catedral
[Imagem: PICT1309.jpg]
[Imagem: bannerprimeiroencontroSul.jpg]
Smile Herrar é o mano Smile Meu mundo não tem fronteiras, só horizontes Smile Viagem é como a vida: curto cada momento e não tenho pressa de chegar ao fim.
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